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Após 300 anos, manto Tupinambá é devolvido ao Brasil e deve ser apresentado ao público nas próximas semanas

Após 300 anos, manto Tupinambá é devolvido ao Brasil e deve ser apresentado ao público nas próximas semanas

Museu Nacional do Rio de Janeiro anunciou ontem (11) que o Manto Tupinambá – levado por viajantes europeus há mais de 300 anos, como contamos aqui -, chegou à cidade no início de julho e será apresentado ao público nas próximas semanas. A peça estava em Copenhague, capital da Dinamarca, desde 1689. 

Museu Nacional da Dinamarca chama a volta do manto sagrado do século XVII ao Brasil de doação, mas, na realidade, ele está sendo devolvido ao Brasil depois de ter sido surrupiado e levado para Copenhague. Lá, certamente, foi ofertado a famílias nobres e monarcas e, em algum momento, foi parar nessa instituição, onde permaneceu em exibição até junho.

A negociação foi feita por intermédio do Museu Nacional da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) – e coordenação do Ministério dos Povos Indígenas – para repor o acervo perdido no incêndio que destruiu o prédio da instituição em 2018. 

Feito de penas vermelhas de Guará, ave típica do litoral da Bahia, o manto mede cerca de 1,80 m e tem 80 centímetros de largura e é costurado em uma espécie de malha de fibra natural por meio de técnica ancestral do povo Tupinambá.

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E é o mais conservado entre os mantos que existem – há mais dez em museus da Europa -, produzidos entre os séculos XVI e XVII. 

Parceria

O Museu Nacional justificou a demora no anúncio da chegada do manto devido aos preparativos para a apresentação da peça e aos cuidados necessários para sua conservação.

No entanto, o Conselho Indígena Tupinambá de Olivença (CITO) divulgou nota afirmando que seus representantes não puderam fazer a recepção da peça, nem cuidar dela de acordo com os ritos tradicionais de seu povo. 

Em nota publicada nas redes sociais, o conselho declarou que “este manto de mais de trezentos anos é um ancião sagrado que carrega consigo a história e a cultura de nosso povo, como foi transmitido para nós por Amotara, nossa anciã. Reiteramos firmemente que nossa relação com o manto deve ser respeitada” […].

E finalizou: “É essencial que todas as decisões futuras sobre o manto e a cerimônia de abertura respeitem os acordos estabelecidos e reconheçam a importância cultural deste sagrado para nosso povo”.

Segundo a artista e antropóloga Glicéria Tupinambá, que integra o Grupo de Trabalho do Ministério dos Povos Indígenas para a recepção do manto, ele não está sendo tratado com o “cuidado cultural” que lhe é devido e a indígena só foi avisada sobre sua chegada ao país quando já estava no museu. 

Para garantir tais cuidados, em 2022 Glicéria esteve na Dinamarca para estudar o manto, mas, segundo ela, o Museu Nacional não cumpriu o combinado.

Manto Tupinambá chega ao Brasil e deve ser apresentado ao público nas próximas semanas
Gliceria Tupinambá e o manto de seus ancestrais no 
Museu Nacional da Dinamarca, em Copenhague (2022)
Foto: Renata Cursio Valente/Museu Nacional (URFJ)

“Nós do Grupo de Trabalho iríamos tratar de como seria a recepção, para a acolhida ao manto quando chegasse. A gente não estava sabendo quando o manto chegou. Não só repatriamento institucional com embaixador e museu é necessário, mas também a presença dos rituais e cerimônias religiosas. Diferente de tratar o manto como simplesmente um objeto”, protestou Glicéria ao G1. 

Segundo ela, a comunidade Tupinambá da Serra do Padeiro, que vive na Terra Indígena Tupinambá Olivença (ainda não demarcada), no estado da Bahia, solicitou a devolução do manto em 2002. E, somente em agosto do ano ado, a “doação” da peça pelo museu dinamarquês foi anunciada em ação conjunta do embaixador brasileiro na DinamarcaRodrigo de Azeredo Santos, com o Museu Nacional. 

“O manto é um item vivo e nós, Tupinambá, achamos necessário que a sociedade saiba que conseguimos um ato importante, que é sua volta”, completou.

No comunicado enviado à imprensa para anunciar a chegada do manto, a direção do Museu Nacional do RJ declarou: “Neste momento, pedimos a compreensão de todos, pois queremos organizar a apresentação do manto com todo cuidado e respeito aos saberes dos povos indígenas, com quem estamos trabalhando em harmonia e contato direto, através do Ministério dos Povos Indígenas”.

Em declaração feita no ano ado, o museu adiantou que a relíquia ficará numa pequena sala preparada com cenografia apropriada, planejada pela equipe da instituição em parceria com os indígenas Tupinambá. E também disse que a exibição do manto faz parte das celebrações dos 206 anos do museu, completados em 6 de junho.

Em suas redes sociais, o ministério declarou hoje (12) que recebeu “com grande satisfação, a chegada do manto” e que “o artefato está sob a guarda do Museu Nacional do Rio de Janeiro, que será responsável por sua conservação e futura exposição”. 

“O governo brasileiro agradece a cooperação das autoridades dinamarquesas na tramitação do processo de repatriação do artefato, que contribuirá para o resgate da história e da cultura dos povos indígenas e a reafirmação da diversidade cultural brasileira”, conclui o ministério. 

Réplicas

Os mantos sagrados Tupinambá, eram utilizados por pajés em rituais. Nos dias atuais, todos os anos, o povo Tupinambá de Olivença – que vive no sul da Bahia, a cerca de dez quilômetros ao norte da cidade de Ilhéus, em suas terras que vão da costa marítima, na vila de Olivença, até a Serra das Trempes e a Serra do Padeiro – relembram a morte de Marcelino, líder indígena perseguido, preso e assassinado em 1937

Nessa celebração, os Tupinambá realizam uma marcha para a qual produzem réplicas dos antigos mantos, com o intuito de expressar a vitalidade e a complexidade de sua cultura, além de reafirmar a força de seu projeto coletivo de futuro.

artista e professora indígena Célia Tupinambá é a primeira, em 400 anos, a produzir mantos Tupinambá que substituem os originais em rituais. Ela contou à Mídia Ninja (em 2023) que, para seu povo, a doação/devolução da Dinamarca representa o resgate de uma memória transcendental já que o manto não é apenas um objeto, mas seu ancestral, pois contém energia e se conecta com seu povo. 

“Eu vejo essa movimentação como se fosse dos próprios ancestrais querendo voltar para o seu território”, explica Célia. “Se você pensar que esses objetos são sagrados e eles estavam em uma missão, agora chegou o momento deles fazerem o retorno para seus territórios”.
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Fotos: Roberto Fortuna/Museu Nacional da Dinamarca/divulgação

Com informações do G1, Veja, Mídia Ninja

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cauby
cauby
10 meses atrás

O manto ainda existe e está bem preservado porque não estava no Brasil. Aqui ele receberá o mesmo tratamento que foi dado ao Museu Nacional que virou cinzas. Estaria bem melhor se permanecesse com os dinamarqueses.

Gilson Dart Tupinambá
Gilson Dart Tupinambá
10 meses atrás

Boa tarde. No Rio de Janeiro, temos o integrante mais idoso da família Tupinambá que chama-se Gilson Dart Tupinambá, auditor fiscal aposentado que atualmente conta com 80 anos de idade.

Marci
Marci
10 meses atrás

É muito triste a falta de consideração que o Brasil tem com os povos indígenas é vergonhoso. Este manto existe exatamente porque não estava no Brasil o futuro dele agora é incerto.

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