
Mahmoud Ajjour tem apenas nove anos e vivia em Gaza. Logo que os ataques de Israel (em revide desproporcional à invasão do Hamas em 7 de outubro de 2023) começaram, ele e a família abandonaram a casa em que viviam.
E foi durante essa fuga, em meio a um ataque aéreo israelense na cidade de Gaza, que ele foi atingido e perdeu os dois braços. Devido à mutilação, Ajjour foi um dos palestinos transferidos para Doha, no Catar, para receber tratamento médico.
Lá, a fotojornalista palestina Samar Abu Elouf o conheceu. Ela deixou Gaza em dezembro de 2023, pouco depois doinício dos ataques de Israel e, na ocasião em que encontrou Mahmoud, trabalhava para uma reportagem encomendada pelo jornalThe New York Times sobre os palestinos atendidos em Doha (Amputações, desfiguração e danos cerebrais: seus ferimentos mudam vidas), publicada em novembro de 2024 (e outras reportagens de Samar, aqui).
A imagem que mostra o menino sentado, banhado pela luz do sol, olhando para o lado (talvez sob orientação de Samar), tocou o júri, que analisou 59.320 fotografias de autoria de 3.778 fotojornalistas e a escolheu como Foto do Ano devido à “forte composição e a atenção à luz”, que se reforçam questões sobre o futuro de Mahmoud.

Foto: Samar Abu Elouf
“Esta é uma foto silenciosa que fala alto. Ela conta a história de um menino, mas também de uma guerra maior que impactará gerações”, disse Joumana El Zein Khoury, diretora executiva da World Press Photo.
De acordo com o texto publicado pela WPP, o menino está aprendendo a usar os pés – já joga, escreve e, também, abre portas com eles – e seu maior sonho, agora, é “usar próteses e viver sua vida como qualquer outra criança”.
“Como vou conseguir te abraçar?”
“Uma das coisas mais difíceis que a mãe de Mahmoud me contou foi que, quando ele percebeu que seus braços estavam amputados, a primeira frase que disse a ela foi: ‘Como vou conseguir te abraçar?’”, conta Samar.
Na reportagem especial do NYT há relatos de sua mãe, Noor Ajjour, sobre o momento do bombardeio. Ela explica que, quando a família fugiu de casa, logo após o início do ataque israelense, nem todos os parentes conseguiram deixar o local rápido. Seu filho então retornou para incentivá-los a irem mais depressa e foi atingido.
A explosão arrancou uma de suas mãos e mutilou a outra. Desesperado, Mahmoud pediu para ser deixado pra trás porque não iria resistir. “Vou morrer”, dizia.
A trajetória de Samar
Samar Abu Elouf começou a fotografar em 2010, com um celular, contou ela à uma seção de entrevistas – The Wider Image – no site da agência Reuters. Incentivada por um amigo, buscou um curso profissionalizante, o que a incentivou a produzir mais e a focar em retratos do dia a dia em Gaza. Ao mesmo tempo, formou-se em produção e apresentação de TV.

Seu primeiro trabalho como repórter de guerra aconteceu em 2012, durante conflitos de Israel com grupos radicais. Dois anos depois, ela descreveu a guerra entre palestinos e israelenses (50 dias!) como o conflito mais intenso que havia coberto e compartilhou impressões sobre o trabalho de fotojornalista em Gaza.
“Para ser fotógrafo em um ponto crítico como Gaza, você precisa levar sua câmera com você onde quer que vá. Eu queria me tornar fotógrafa para que minhas fotos contassem as histórias do povo de Gaza para pessoas ao redor do mundo!”.
E Samar completou: “Fotojornalismo é o cerne da verdade ao redor do mundo. Um verdadeiro fotojornalista conta o que sente e vê sem distorção. Pessoas ao redor do mundo podem entender a realidade através de uma imagem”.
Desde o conflito Israel-Gaza em 2021, a fotojornalista colabora com o The New York Times. O belo e comovente retrato que produziu para o jornal ficou entre as 42 fotos premiadas de todo o mundo, conquistando o maior prêmio do World Press Photo.
Ao longo de sua carreira, Samar tem trabalhado para organizações internacionais, veículos de mídia e agências como Reuters, NZZ, and Middle East Eye.
Duas fotos para o segundo lugar, uma delas feita na Amazônia
Este ano, o júri do WPP selecionou duas fotos para o segundo lugar, uma delas foi feita no Amazonas, mas não por um brasileiro, mas por um peruano: Musuk Nolte, que também é editor.

Secas na Amazônia mostra um homem jovem no leito seco do Rio Solimões, olhando o horizonte – que desalento! Ele carrega suprimentos que levaria, em seguida, para sua mãe, que mora na aldeia de Manacapuru, no Amazonas que, antes da seca, era ível por barco. Agora, ele precisa andar dois quilômetros sob o sol escaldante para chegar até ela.

Foto: Musk Nolte
A imagem (produzida para a Panos Pictures e a Fundação Bertha) torna “os efeitos das mudanças climáticas, que muitas vezes parecem abstratos ou difíceis de representar, uma realidade tangível e concreta que molda o futuro de comunidades vulneráveis intimamente conectadas com o mundo natural”, declara a WPP.
A segunda foto que ficou em segundo lar é Night Crossing, de John Moore, fotógrafo sênior e correspondente especial da Getty Images, que mora em Stamford, Connecticut, EUA.

Moore retratou imigrantes chineses – o terceiro maior grupo imigrante nos EUA – ao lado de uma fogueira, numa noite fria e chuvosa, após cruzarem a fronteira entre com o México.

Foto: John Moore
A WPP conta que “os encontros entre cidadãos chineses não autorizados e a Alfândega e Proteção de Fronteiras dos EUA na fronteira EUA-México aumentaram de cerca de 2.200 em 2022 para 38.200 em 2024; enquanto na fronteira EUA-Canadá quase dobraram, de 6.700 para 12.400”.
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Com informações da World Press Photo 2025